quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

OS FUNDADORES... ERAM DOIS!

OS FUNDADORES... ERAM DOIS!
Isaac Duarte de Barros Junior *

Terminados os conflitos militares envolvendo o império brasileiro e a república do Paraguai, com a morte do marechal Francisco Solano Lopes pelos comandados do general Câmara as margens do rio Aquidaban, em Cerro Corá. Cessadas as hostilidades completamente, o exército convencionou chamar a essa operação militar de campanha do Paraguai. Historicamente, o resultado foi uma enorme carnificina e o maior genocídio americano, onde milhares de mortos apodreceram nos campos de batalha. Tendo falhado o infame propósito do estado maior do comandante em chefe, conde D’ Eu, que era o de eliminar a população masculina paraguaia, se fosse preciso no útero da própria mãe. Vencida a guerra, foi estimulado pelo governo imperial a ocupação das terras conquistadas, denominadas terras devolutas. O procedimento básico latifundiário era simples, bastava o posseiro grilar uma área considerada terra devoluta, erguer nela uma casa para morar, cercar com arame de preferência farpado e depois era só requerer a posse definitiva nos órgãos representativos governamentais. Esse requerimento, na província do Mato Grosso pós-guerra da tríplice aliança, se fazia no tabelionato em Cuiabá e nesta região quase desabitada, no tabelionato do município de Nioaque.

Para assegurar a soberania brasileira nas terras incorporadas ao território nacional, a grilagem de terras devolutas virou uma espécie de costume trivial useiro. Muitas povoações surgiram à beira das estradas, em forma de colônias sem lei, habitadas por migrantes perigosos. Enquanto isso, lugarejos desapareceram tão rapidamente como surgiram. Descobri pesquisando exaustivamente, que nessa centena de posseiros aventureiros do final do século dezenove, estava Joaquim Teixeira Alves, Marcelino José Pires Martins, Izidro Pedroso, Francisco Xavier Pedroso, João Vicente Ferreira, entre outros. As famílias Vieira e Mattos, chegaram a Dourados no começo do século vinte e logo apadrinharam a futura emancipação política administrativa da cidade. Mas antes disso acontecer, os dois primeiros mencionados desbravadores planejaram por razões financeiras fundar um povoado nestas paragens. Marcelino, o mais bronco e muito católico, simbolicamente ergueu uma cruz enorme de madeira na sua posse e doou um quinhão para as pessoas que quisessem fazer a exploração das áreas devolutas localizadas na divisa da fazenda Alvorada até onde hoje se localiza a Praça Antonio João. Joaquim, um pouco mais comedido, doou e incentivou a ocupação gradual organizada das posses que começavam na Fazenda Cabeceira Alta, próxima do atual distrito industrial e terminavam nas proximidades da mesma Praça. Por esse motivo, o centro da cidade douradense começou a se formar ali e as brigas entre a dupla, idem.

Sendo geograficamente privilegiado por estradas de escoamento pecuário, um dos lados da cidade desenvolveu e evoluiu mais do que o outro. Apesar disso, havia a certeza de ter dado certo o projeto dos dois posseiros. Nesse período de grande progresso, o fazendeiro Joaquim Teixeira Alves foi morto misteriosamente. Coincidentemente, no dia do atentado, seu filho João estava no colo paterno e o mesmo projétil que matou Joaquim Teixeira Alves, fixou-se no pescoço do seu Joãozinho. Eu o conheci com idade avançada e sei que reclamava muito daquele estilhaço. Como o Joaquim Teixeira Alves, era um homem pacato e não tinha inimigos, durante muitos anos à população suspeitou injustamente de ser mandantes do crime, Marcelino Pires e o Juiz Paulo Hildebrando.

Entretanto, o mais correto a se concluir dessa tragédia centenária, é que tudo foi uma vingança antiga perpetrada por algum desconhecido, certamente era um desafeto ladino, pois nunca o identificaram. A rigor, muitos desses pioneiros douradenses deixavam culpa no cartório, geralmente oriunda dos lugares de onde procediam. Entretanto, o gaúcho Joaquim Teixeira Alves, morreu no ano de l911 e o paranaense Marcelino Pires, faleceu no ano de 1915, de uma grave enfermidade. Quanto à dona Pureza Carneiro Alves, viúva do pioneiro Joaquim, vendeu parte das suas terras ao fazendeiro Izidro Pedroso, que mudou a denominação da propriedade para fazenda coqueiro. A viúva de Marcelino, dona Eulália Pires, casou-se novamente e mesmo passando por sérias dificuldades financeiras, nunca abriu mão das terras requeridas pelo primeiro marido.

Os anos foram passando e aos poucos o povoado das Três Padroeiras crescia, pertencendo ao município de Ponta Porã. Foi nessa época, que aqui viveu um homem chamado Januário Pereira de Araújo. Historicamente, ele construiu no perímetro urbano douradense a primeira casa de madeira, seguindo-se a essa construção vários ranchos de sapé. Januário, também foi o primeiro construtor das quatro casas seguintes. Na década de trinta, 1932 para ser preciso, os habitantes do patrimônio, liderados pela família Mattos iniciaram movimentos populares visando dar melhor aspecto público a Vila de Dourados, agora nome oficial. O objetivo era modificar e colocar em linha reta a rua principal, a rua debaixo e a rua dos velhacos. Os engenheiros agrônomos, Dr.Valdomiro de Souza e Dr.Wlademiro Muller do Amaral foram os encarregados da medição. Assim, quando o interventor Mário Correa da Costa, criou por decreto Lei o município de Dourados no dia 20 de dezembro de l935, a rua principal, recebeu a denominação de Marcelino Pires, a rua debaixo o nome de Paraná (atual Joaquim T. Alves) e a rua dos velhacos de Rio Grande do Sul (atual dep. Weimar G. Torres). Ora, se a data 20 de dezembro, nunca representou a data de fundação da cidade, obviamente, festejar como aniversário de Dourados essa efeméride de assenso é uma teimosa bobagem bairrista, pois uma cidade não é fundada no dia em que se torna município.

Porém, a passagem da medição das ruas douradenses e de muitas outras ruas, foi documentada graças ao nosso primeiro fotógrafo, o Raul Frost. Havia um justificado pormenor pela inexistência de mais fotos, é que tanto o Dr. Vadú, como o Dr. Amaral, eram técnicos sistemáticos e avessos a posar para fotógrafos. Comportaram-se assim, todos os seus contemporâneos. O Vadú, acontecimento comum naquele tempo, foi morto a tiros de revólver. Quanto ao seu Amaral, um empreendedor de visão extraordinária, este pode na velhice ao final da sua benemérita vida, contemplar o resultado do trabalho realizado nas largas ruas desta cidade nos anos trinta. Assim, como os irmãos Rômulo e Remo, lendários guerreiros fundadores de Roma. Concluí baseado em depoimentos, muitos deles fornecidos por outros pioneiros, que os dois desbravadores, Joaquim T. Alves e Marcelino Pires Martins, apesar das escaramuças, ambos fundaram a cidade de Dourados. E querer mudar esse contexto é história mal pesquisada, elaborada no mínimo com irresponsabilidade por historiógrafos desinformados...!

*Advogado criminalista, jornalista.
e-mail: isane_isane@hotmail.com

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