terça-feira, 10 de novembro de 2009

MAGISTRADO CYRO MELLO

Isaac Duarte de Barros Junior*

Quando falamos a respeito de soberania nacional em nossas fronteiras, principalmente nas fronteiras divisórias do Mato Grosso, devemos nos lembrar que elas nos foram asseguradas pelos guerreiros sulinos, cavaleiros rústicos do século dezenove. Muitas foram essas nossas páginas épicas, escritas nos anais da história pós-guerra do Paraguai. E todos esses fatos ganham vida novamente, quando em pensamentos cavalgamos nas ancas das lembranças no lombo de cavalos relinchando nas estradas de pó vermelho, tempos que eram montados por indômitos gaúchos guerreiros de lança.
Centenas desses rio-grandenses, passada á luta fratricida, retornariam pilchados nestas paragens. Lugar, onde fardados foram aliados dos índios guaicurus, cavalgando juntos nas batalhas da tríplice aliança. Afinal, foi neste solo, que eles travaram sangrentas lutas com os paraguaios de Francisco Solano Lopes. Alguns deles, como o coronel João de Oliveira Mello, resolveu ficar no sul depois da guerra. Porém, falava tão entusiasmado destas plagas férteis com matas densas, que seu filho Cyro Silveira de Mello, nascido no ano de 1884 em Cruz Alta, se interessou por conhecê-las. Cyro Mello tinha treze irmãos, destacamos alguns: Alonso (bispo católico), Raul (general de exército), Tupy (médico) e Mário (advogado).
Aos dezoito anos, Cyro Mello foi morar na capital gaúcha, arrumando serviço numa tipografia. Em seguida, se alistaria num batalhão do exército brasileiro, que se deslocou de Porto Alegre para a região norte do Brasil. Em 1902, estava sob o comando do general José Plácido de Castro, quando este militar expulsou os bolivianos instalados nas divisas da amazônia, retomando na força o Território Federal do Acre. Contraindo a febre beribéri que grassava no norte, doença provocada por um terrível mosquito, Cyro Mello terminou sendo hospitalizado. Posteriormente, licenciado das tropas beligerantes, embarcou de volta para o Rio Grande do Sul, onde aportou pelo mar, sendo recebido como herói na sua terra natal. Seu pai, primeiro intendente (prefeito) de Cruz Alta, havia comprado mercadorias e uma junta mansa de bois carreteiros, incentivando-o a conhecer nossa região em fase de povoamento.
Cyro Mello, moço cheio de vigor, deixou a cidade de Cruz Alta nos pampas sulinos em 1905. Passou por Palmas e Guarapuava, entre outras cidades do Paraná, seguindo estradas rumo do sertão. Por uma delas, atravessou os Rios Iguaçu e Paraná. Chegando ao Vale do Ivinhema depois de meses, concluiu sua longa viagem em 1906 instalando-se em Ponta Porã, promissora cidade mato-grossense. Em 1908, conheceu a jovem Laudemira Coutinho da Rocha, argentina de 16 anos, com quem se casou naquele mesmo ano. Após o matrimonio, foi morar na zona rural pontaporanense num lugar chamado Capão Rico. Cultivou cereal e tornou-se próspero criador de gado.
No ano de 1910, mudou-se para a fazenda Passo dos Dourados, onde criava cavalos e ainda trabalhava como balseiro na travessia de pessoas no Rio Dourados. Naquele mesmo ano, retornaria a Ponta Porã, criando gado na fazenda Ramalhete. Em 1913, atendendo um convite formulado pelo coronel Baltazar Saldanha, exerceu o cargo de secretário geral desse prefeito. Criada a Comarca de Ponta Porã, foi nomeado Promotor Público, já que o interventor (governador) tinha poderes de nomear pessoas para essa função. Usando das mesmas atribuições, outro interventor nomeou Cyro Mello, Juiz de Entre Rios (Rio Brilhante), em 1932. Esse gaúcho era um homem culto, lia e relia livros, assim como os jornais do país e do exterior. Acima de tudo, Cyro Mello foi espírita convicto, seguidor fiel dos ensinamentos do francês Alan Kardec.
Retornando ao município Dourados no ano de 1934, o veterano Cyro Mello, ex-professor ambulante, boticário homeopático, guarda livros (contador) e farmacêutico, passou a se interessar por política partidária. Submetendo seu nome ao crivo das urnas em 1936 pelo Partido Evolucionista, elegeu-se membro do Conselho Municipal e nessa legislatura exerceu as funções de secretário da mesa diretora. Voltou a ser reeleito, desta vez como vereador pelo município de Dourados, no ano de 1946. Porém, com a promulgação da nova Constituição Federal, aboliu-se a nomenclatura “Conselho Municipal”. Assim, ao invés da denominação de “conselhereiro” para seu titular, o cargo destinado aos eleitos passou a ser chamado de vereador, como agora é conhecido.
O gaúcho Cyro Silveira de Mello, homem talentoso acreditava no desenvolvimento progressista, falecendo em Dourados aos setenta e sete anos, em abril de 1962. Foi sepultado no cemitério Santo Antonio, no mesmo em que repousa a maioria de outros pioneiros douradenses. Nesse local, seus restos terrenos, descansam na paz espiritual da última morada. Para homenagear o patriarca dessa família antiga, entre as poucas centenárias desta cidade, seu nome foi imortalizado numa das nossas ruas mais conhecidas...
*advogado criminalista, jornalista.
e-mail: isane_isane@hotmail.com

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