quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

A geada de 1975

Braz Melo
Nunca tinha assistido a um frio igual. Amanheceu o dia 18 de julho de 1975 tudo branco. A temperatura caiu de vez e dizem que chegou a 5 graus negativos. Por aqui fazia frio, mas igual a esse nunca tive noticias.
Os estados de São Paulo, Paraná e sul de Mato Grosso sofreram com essa geada. O Paraná nunca mais foi o mesmo. O fenômeno acabou com as plantações de café e conforme o governador Jaime Cannet disse na época que o estado do Paraná teria um prejuízo imenso e nunca mais seria o mesmo. Realmente no outro ano sua arrecadação caiu quase 20%. Londrina, que era a capital mundial do café, de um dia para outro os agricultores não sabiam o que fazer. Há partir desse desastre, passou-se a plantar mais soja, pois sendo uma cultura de verão, fica isento de geadas, e foram em buscas de outras atividades que fez o estado do Paraná passar por uma transformação imensa e hoje é um dos estados mais desenvolvidos do país.
Voltando à nossa Dourados, quando acordei naquele dia e abri a porta, pensei que estava entrando numa geladeira. O carro estava todo branco e não pegou fácil. Mais tarde quando cheguei ao escritório da SANEMAT, o caminhão e a retro-escavadeira, por serem movidos à diesel, só pegaram depois de esquentarem seus motores com fogueiras. E isso só às 11 horas da manhã. O poço profundo nº1, que ficava ao lado do Fórum, a água congelou e só mais tarde conseguimos funcionar a bomba.
Foi um transtorno total. A agricultura foi a mais afetada. Naquela época tinha cafezais na região e apesar da safra já ter sido colhida, perdeu-se tudo. Contam que o frio penetrou até na raiz dos pés de café. Não tinha como salvar nada. Até o trigo, que é uma cultura do inverno, perdeu 80% de sua safra. Na pecuária a geada tinha queimado o pasto. No pantanal morreu muito gado com o frio nunca visto. Só o Tonanni, na Fazenda Cristal, perdeu 70 mil pés de café. Imagina uma região inteira.
A CEMAT (Empresa de Energia de Mato Grosso) teve 200 trechos de cabo de energia estourados, já que eles eram preparados para no calor dilatarem e com o frio retraíram tanto, que romperam.
O prefeito era João Totó Câmara, que junto com vereadores e o gerente do Banco do Brasil Marcilio Terzelli receberam em nossa cidade o Ministro da Agricultura Alysson Paulinelli, acompanhado do então Senador Rachid Saldanha Derzi, que aqui vieram ver “in loco” o estrago causado pela geada. Acredito ter sido a maior perda imediata que nossa região teve em sua economia.
Minha filha Mirella tinha nascido em junho e Anete não tinha a facilidade que as mães têm hoje com fraldas descartáveis. Eram dezenas de fraldas no varal e com a chuva fria não tinha ninguém que agüentasse. O frio era tanto que tive de comprar e mandar instalar um ar condicionado quente/frio e na noite seguinte dormimos todos no mesmo quarto.
Pelo estrago causado em São Paulo, sul de Mato Grosso e principalmente no Paraná, muitos agricultores deste ultimo estado, venderam suas terras e foram procurar novas terras em Mato Grosso e Rondônia. Alguns ficaram por aqui, e trouxeram novas técnicas e experiências, como os gaúchos tinham feitos no inicio da década. A região se uniu, deixando as paixões bairristas de lado, e torcendo por um todo. Era a Grande Dourados em jogo. Até a classe política teve de se unir.
E como dizem por aí, “só pode melhorar, quando está ruim”, em pouco tempo conseguimos esquecer o trauma e conquistarmos vitórias nunca antes conseguidas.
Deus sabe o que faz. Mas nós temos de ajudá-lo também. Ele já mandou o recado com a crise que vemos todo dia pelos noticiários da TV. Ontem começamos a sentir na carne, pois a Perdigão de Dourados deu férias coletivas aos seus 1600 funcionários. Ou estamos esperando ter uma nova geada?

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